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Esperança

Eis que as pálpebras da noite descortinam um novo dia
e um tênue raio de luz penetra pela fresta da janela matutina:
acorda a esperança, se espreguiça e, liberta do cansaço, vai à luta;
segue, sem pressa, sua labuta diária de disseminar-se por todo o planeta,
a expectar toda forma orgânica de vida: da mais simples, à mais complexa.
Nasce a esperança do ovo, da semente, do ventre da gestante;
a vislumbramos no olhar opaco do idoso e nos luzir dos olhos do infante;
vive no lar opulento do rico e sob o teto de zinco do pobre casebre.
Ilumina o céu de todos, clareando, inclusive,
o fim do túnel dos ímpios: escuro como breu;
unifica, na espera, a esfera do tempo: passado, presente, futuro;
transpõe eras, fronteiras, estações;
edifica-se em uma só crença ecumênica: o ideal de perene bonança;
nega toda espécie de desgraça: violência, fome, abandono...
sorri-nos, com a singeleza e inocência que uma criança encerra,
e nos carrega nos braços, aliviando o peso dos ombros.
A esperança é balsâmica, emoliente, é cataplasma:
purifica corações, abranda a dor, tonifica almas.
A esperança é artista plástica: com cacos de vidro quebrado,
nos dá de presente um mosaico. Faz uso de material reciclado;
restaura a antiga pintura e pendura um novo quadro na velha parede.
A esperança é dinâmica: move-se, remove obstáculos, revolve entulhos.
Anda, mergulha, voa, salta muros, escala montanhas;
dá-nos as mãos, nos acena, aponta atalhos nos caminhos.
Serve-nos de cais, ancoradouro da fé, segurança de um porto.
Abraça-nos, preenchendo o vazio do peito, e nos dá um alento:
a certeza de não nascermos sozinhos, fadados ao infortúnio.
Nascemos ligados a um fio de esperança:
o direito à vida, de um sonho dado por natimorto.

valéria tarelho

Comentários

Anônimo disse…
morrendo de saudades III